Entrevista Juliano Klevanskis
Nelson Burd, nosso correspondente em Israel, entrevista o escritor Juliano Klevanskis, que nos dá subsídios para adentrar na Literatura Judaica – rica e ainda pouco explorada no Brasil. Nelson é jornalista, cursa mestrado de História na Universidade Bar Ilan. Escreve para sites brasileiros, é correspondente da Rádio Israelita de Porto Alegre, vinculada à Band, e envia boletins para a TV Mosaico, de São Paulo.
Quem és tu? Qual a tua atividade de Juliano Klevanskis com a literatura? Sou escritor de literatura, apaixonado por culturas, línguas e meio ambiente. Publiquei livros de cordel em Belo Horizonte (2000-02). Graduei-me em Relações Internacionais pela PUC-MG, onde apresentei a monografia: Hegemonia e Contra-Hegemonia: Literatura e Relações Internacionais em Gramsci (2004), e ensinei um workshop denominado Literaturas Indígena e Indigenista (2003-04). Meu primeiro livro publicado por editora foi Maíra & Cururmim (2005), primeiro da trilogia sobre os índios na descoberta e colonização do Brasil. Trabalhei como Tradutor, Corretor Ortográfico no Tribuna de Contagem (2003).
Em 2006, mudei-me para Israel, terminei o Mestrado em História Geral pela University of Haifa (2010), e comecei a escrever um livro bilíngue (Português-Hebraico), pretendendo assumir assim a identidade de escritor binacional. Atualmente sou coordenador da Cátedra de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Haifa e secretário da Embaixadora do Brasil em Israel.
Juliano, comente tuas obras publicadas, por favor. Escrevi dois livros de contos: Nem Te contos (2002) e Curumim na Terra Sem Males (2004). Publiquei algumas crônicas em O Litoral e Tribuna de Contagem. Escrevi crônicas avulsas, as quais, algum dia, farão parte de um livro chamado Alguma Crônica, Descobrimento do Brasil, ou Diário da Coroa.
Escrevi cinco peças teatrais, dais quais duas foram publicadas sob a forma de literatura de cordel: Poeta J.M. (2001), O Ociólogo (2002), e as demais não: Um Diretor de Cena e o Circo (2003), Auto de Natal (2004), Zorobabê – O Elogio do Medo (2010). Destaco este último, por ser o primeiro da minha trilogia sobre os índios durante a descoberta e colonização do Brasil, e por ser minha mais recente criação: “Zorobabê – O Elogio do Medo” é uma tragicomédia. Os personagens Capitão, El-Rei e Frei se esforçam em conquistar o Brasil, e o Francês em manter aliança com Zorobabê, líder da tribo. “O elogio do medo” se refere ao medo dos indígenas perante os europeus. Com linguagem poética e metafórica, revelam-se a mazelas da colônia. Os personagens Mbunda e Virgens Fiéis trazem à cena cantigas e ditos populares. A peça termina com a reconciliação de todos, que se juntam para cantar e celebrar o Brasil**.
Escrevi muitos poemas, ora atento à métrica e ritmo, ora à liberdade métrica, dependendo da minha fase e influência. Há alguns anos, recontando meus poemas guardados na gaveta, auferi que totalizavam 10.000, o que comprova que eu era um poeta compulsivo. Alguns dos meus poemas estão consubstanciados nestes livros: Maíra & Curumim (2003), Apaga-se a Luz (2004), De Gaia ao Nazismo (2005), Abutres no Melting Pot / נשר בכור היתוך (Bilíngue).
Neste último, busco inspiração na sociedade israelense. Busco elementos, desde os políticos aos sociais, de pessoas a lugares, que, isoladamente ou combinados, são os componentes da minha criação, e que me permitem criar uma ficção quotidiana. Assim, utilizo-me de temas e imagens reais para criar uma ficção quotidiana.
Quais teus autores preferidos na temática judaica e israelense? Amós Oz, Abraham B. Yehoshua, David Grossman, S. Y. Agnon e Aharon Megged são os meus autores israelenses preferidos.
Quais as diferenças e semelhanças entre a literatura brasileira e as literaturas israelenses e judaicas? O Estado de Israel se localiza entre os três continentes: Europa, Ásia e África. Em muitos aspectos, este Estado se tornou um modelo e um símbolo de conflito e ao mesmo tempo coexistência, tolerância e respeito mútuo entre judeus, árabes, drusos e novos imigrantes, que formam desta a sociedade mais pluralista no Oriente Médio. A sociedade israelense é um microcosmo da sociedade universal, numa tentativa de ser como o Brasil é: o país do pluralismo cultural. Obviamente, a literatura hebraica contemporânea reflete este fenômeno.
A literatura hebraica contemporânea, da qual estou mais familiarizado, acompanha o cenário da reconstrução nacional do povo judeu na Terra de Israel, a partir de 1948. Alguns dos aspectos nela são percebidos: intrincado de complexas relações sociais; mudanças rápidas e intensas, devido às guerras à construção do estado e à imigração em massa.
Eu gostaria de me concentrar no conceito de Literatura Israelense, em contraposição ao de Literatura Judaica, a qual diz respeito também à Literatura Ladina, Literatura Yidische, Literatura Chassídica, Literatura Rabínica, Torá, Midrash, Talmud, Cabala, etc. Assim, incluo no conceito de Literatura Judaica tudo que foi escrito por judeus desde os tempos mais remotos até os mais modernos sem distinguir idioma ou país de origem. Alguns romancistas judaicos de destaque: Isaac Asimov, Paul Auster, Saul Bellow, Michael Chabon, Jonathan Safran Foer, Primo Levi, Norman Mailer, Philip Roth, Richard Zimler.
A Literatura Israelense, em termos gerais, engloba as obras literárias escritas por israelenses, em grande parte escrita em hebraico, mas também em árabe e em outras diversas línguas da enorme população de imigrantes.
Na Prosa, Yossef Chaim Brenner e Shmuel Yossef Agnon, deram impulso à prosa hebraica no início do século XX, e são considerados os pais da literatura hebraica moderna. Os escritores nascidos no país começaram a publicar nos anos 40 e 50, conhecidos como “a geração da Guerra da Independência”. Com uma nova mentalidade, e tendo o hebraico como língua materna, vemos surgir escritores como S. Yizhar e Moshe Shamir. No início da década de 60, um grupo de jovens e influentes escritores, como A.B. Yehoshua e Amos Oz, romperam com os padrões ideológicos e manifestaram tendências de experimentação, e de ceticismo em relação às convenções sociais. Durante as décadas de 80 e 90, o número de escritores aumentou consideravelmente. Escritores como Oz, Yehoshua, David Grossman e Meir Shalev, ganharam muito prestígio internacional. Alguns temas recentes surgiram, tais como: as vilas árabea, a realidade dos judeus ultra-ortodoxos, os indivíduos sem fé, os imigrantes provenientes de países árabes. Enfim, estes elementos nos incentivam a esmiuçar a extraordinária literatura de romancistas como Yossl Birstein, Chaim Beer, Yitzhak Auerbach, Sami Michael, Albert Suissa, Dan Banaya-Seri, Yitzhak Ben Ner, Kaniuk, Grossman, etc.
Na poesia contemporânea, no final do século XIX, quando o sionismo começou a ganhar importância, temos Chaim Nachman Bialik (1873-1934) e Saul Tchernichovsky (1875-1943). Eles incorporaram influências externas e internas à tradição judaica. Assim foram ao mesmo influenciados pela poesia do passado, a dos temas religiosos e nacionais, mas ao mesmo tempo romperam com a tradição. A segunda geração de poetas é composta por Avraham Shlonsky, Natan Alterman, Lea Goldberg e Uri Zvi Greenberg, etc., testemunhos do estabelecimento do Estado de Israel, e influenciados pelo futurismo e simbolismo russos e pelo expressionismo alemão.
Em meados dos anos 50, emergiu um novo grupo de jovens poetas, cujo idioma materno era o hebraico, tal como Yehuda Amichai e Natan Zach. Suas obras tendem a uma observação livre da realidade, com uso do estilo coloquial, além da substituição das influências poéticas de Pushkin e Schiller pelas dos autores ingleses e norte-americanos modernos. A poesia da geração mais recente será dominada pelo individualismo, pelos poemas curtos, pelo ritmo livre e sem rimas. Meir Wieselthier, Yair Horowitz, Iona Wallach, Asher Reich, Arieh Sivan, Ronny Somak e Moshe Dor são autores que vale a pena conferir.
Deixe mensagem aos leitores… Tanto Brasil quanto Israel são fontes de inspiração para mim. O Brasil não tinha destaque na cultura mundial, nunca ganhou um Prêmio Nobel, embora tenhamos alguns dos melhores cientistas do mundo e uma incomparável riqueza cultural e folclórica. Assim, eu me aliarei a qualquer iniciativa de incentivo ao estudo e tradução dos nossos autores brasileiros, o que poderia render-nos finalmente o reconhecimento internacional.