Movimento - Cartaz da World Naked Bike Ride São Paulo, 2009
Cartaz da World Naked Bike Ride São Paulo, 2009

Movimento

Coluna • 8 de agosto de 2010 • Manuella Bezerra

Depois de alguns anos socada dentro de uma redação de jornal mergulhada no universo dos acontecimentos do esporte, eis que eu levantei um dado importante: jornalistas esportivos, quase em sua totalidade, são extremamente sedentários. Além de não ter hábito de praticar nenhuma atividade física, mesmo que de maneira recreativa, ainda tem costume de fumar e ingerem bebidas alcoólicas excessivamente.

Fui me dando conta disso a partir do momento que comecei a observar – e me desesperar – com o progressivo crescimento do meu próprio bucho, fator diretamente proporcional a minha recente falta de disposição. Uma ironia das grandes para quem sempre foi magra, ativa, e nunca precisou perder neurônios com este assunto – chato, diga-se de passagem.

A vida inteira tive uma relação bem estreita e, ao mesmo tempo, muito impessoal com os esportes. Ainda pequena, fui campeã Norte-Nordeste de natação. Eu tinha nove anos e me lembro bem da minha primeira viagem sem meus pais ao Maranhão, da medalha de ouro e do quanto eu me senti importante por causa daquilo. Era disciplinada, bem mais que hoje, pelo menos. Treinava duas vezes por dia, pela manhã, antes da escola – praticamente de madrugada-, e à tarde, depois da escola. No ano seguinte, minha mãe passou a não me matricular mais. O motivo? Estava ficando uma moça com ombros largos. Isso mesmo, neguinha. Um excelente motivo para abrir mão da minha futura medalha olímpica.

Na ocasião eu fiquei triste, mas confesso que me desprendi rápido. Deve ser porque Deus não dá asa a cobra. De repente, fosse eu uma famosa medalhista, seria chata como a patroa do diabo e mais amostrada do que sou hoje, ainda que não seja coisa nenhuma que preste – Seria possível?

Mal sabia eu que não largar a natação significava a única chance nessa vida de ser atleta e, melhor, livrar-me do ‘grande-mal-do-bucho-de-lama’. Esquecida a natação, já adolescente, resolvi procurar um motivo para ser feliz. Fiz capoeira, body board, musculação, muai-tai, jiu-jitsu, andei de bike, de skate street, patins in-line, corri horrores, tentei aprender a surfar de prancha, a escalar, a saltar, a chutar. Depois de velha cheguei até a retornar para as piscinas numa espécie de ‘revival teen’. Não teve jeito. Nenhuma das tentativas teve continuidade.

Somente uma coisa me deixava tranquila. Mesmo que nunca mais fora ter a oportunidade de me tornar uma atleta de alto rendimento, eu sempre estive em movimento. Mas o sempre chegou ao fim. Eis aqui a ex-provável campeã olímpica dos 50 metros costas casada, com bucho de lama de recém parida – ainda que meu filho já tenha dois anos – e reclamando para subir os três lances de escada da minha residência duas vezes ao dia.

E nem adianta botar culpa em filho, em tempo, em mil atividades, em trabalho, no marido, na mãe, na diarista. A culpa é mesmo do jornalismo esportivo. Ora, ele engana você. Mente dizendo que somente aquelas pautas de esportes radicais eventuais e que o acompanhamento diário dos setores são uma dosagem suficiente de esportes na sua vida. Fosse verdade, eu não sentia preguiça até de ver as provas de resistência do ‘No Limite’. Pelo menos de uma coisa eu mesma me convenci com este texto. Sábado que vem vou na feira do troca comprar uma bike. E digo mais. Na próxima coluna já conto a saga da minha primeira pedalada. Quem se anima?