Viva o roquenrou no Recife! - Mini Box Lunas (Foto: Divulgação)
Mini Box Lunas (Foto: Divulgação)

Viva o roquenrou no Recife!

Matéria • 20 de abril de 2010 • Belisa Parente

Eu e ‘Morphine Girl’ chegamos à caráter na principal festa de rock da cidade, o Abril pro Rock. Não é todo dia que temos a oportunidade de voltar aos tempos juvenis e nos vestir a la Courtney Love e Joan Jett, respectivamente. Quando fomos ao stand daFlowers comprar uma camisa da The Runaways, o vendedor questionou surpreso: “Vocês conhecem a banda?”. Ao qual Morphine respondeu de subido, depois de algumas doses: “Você acha que compraríamos uma blusa de alguém que não conhecemos!?”. Envergonhado, o cara se desculpou: “Vocês são tão novinhas, não imaginei. Mas que bom!”. Pois é man, o rock é nossa praia, principalmente o feminino – finalizei com sorrisos para descontrair.

É verdade que a massa roqueira recifense fica um pouco enclausurada devido à quantidade de bandas que só fazem cover. É Perl Jam, Guns, Beatles e por aí vai… Um saco! Também, não existem programas de rádio do gênero na capital para matar nossa nostalgia, nos surpreender com alguma canção adormecida ou nos apresentar bandas realmente boas, não comerciais. Nesse sentido o Abril pro Rock se destaca por trazer bandas inusitadas ao vivo; e inova com a criação do APR Club, com mais sete dias de festa e 17 bandas se apresentando na Rua do Apolo (Casarão número 143, bairro do Recife) até o final do mês.

A segunda noite do festival foi de altos e baixos, com um público médio, principalmente durante as primeiras apresentações. Mas é bom que seja assim, a maior parte da galera gosta mesmo de música, é critico no sentido questionador, e isso também é bom. Ter receptores mais independentes, alternativos, que enxergam a música como arte, que são músicos também. A banda pernambucana Anjo Gabriel abriu a noite, com uma indumentária hippie e um rock psicodélico – que reflete bem essa coisa dos altos e baixos em uma mesma música, e nos shows do festival nesse sábado chuvoso. Depois foi a vez da Mini Box Lunar, banda do Amapá, com um estilo também psicodélico, mas mais alegre e dançante. A vocalista, Heluana Quintas, lembra até Rita Lee em Os Mutantes. A Plástico Lunar, de Sergipe, parece que ainda não descobriu seu estilo; os meninos, super bem vestidos, fazem um rock convencional com pegadas de blues. Mas a presença de palco falou pelo corpo de Denilton Soares, guitarrista da Bugs, banda de Natal. Que garoto instigado, me impressionou! A banda também tem influências no psicodélico, mas soa mais roquenrou que as citadas anteriormente.

Vendo 147 (Foto: Bruno Sarraf/ Divulgação)
Vendo 147 (Foto: Bruno Sarraf/ Divulgação)

Havia um cantor que eu queria mesmo ver ao vivo, além do super esperado Afrika Bambaataa, é claro. Zeca Viana me ganhou interneticamente com a canção ‘Eterno Domingo’, que não entrou no repertório – curtíssimo, para minha decepção, apenas 30 minutos. Quando o ouvi pela primeira vez meus olhos ficaram marejados, e olhe que isso é difícil de acontecer, sou até durona demais. Sabe o som que dá vontade de escutar com os olhos fechados? A música de Zeca nos faz mergulhar no íntimo, como em “Para lá de Marrakech” e “O Foguete, O fim e O começo”. Se você é mãe vai gostar de tocar Zeca para ninar seus filhotes, algumas músicas têm o cheiro da infância. Eles vão sorrir placidamente com “Doutor Ervilha”. Zeca embalou também casais de namoradinhos no Abril pro Rock 2010; quando tocou “A torneira” bocas se encontraram. Cantou a super sexy, sensual, tal qual “Glory Box” de Portishead, “Garota Non Stop”. Esse garoto, baterista da Volver, tem uma sensibilidade interessante, típica feminina. Precisamos de mais mensagens assim, sensitivas.

Zeca Viana (Foto: Divulgação)
Zeca Viana (Foto: Divulgação)

O conjunto mais eletrizante do festival foi, sem dúvida, o Vendo 147, da Bahia. Grupo de rock instrumental que inova com uma bateria para dois bateristas – um “clone drum-,dois guitarristas e um baixista. O baixo é abafado pela “pressão” do coração duplo da banda e as guitarras distorcidas. É um som cheio, pesado, sem deixar de ser bom. Os meninos são super elétricos no palco, e bonitos, bem bonitos, mais um ponto positivo, afinal, é mentira dizer que beleza não conta. E se há beleza, talento e uma boa proposta, é maravilhoso, sucesso total. A The River Ride, de Recife, fez o público mexer. Inspirados em Sonic Youth, uma das referências no meu colete preto, fazem um rock meio noise. A Plastique Noir, do ceará, tem uma estética musical sombria. Provavelmente influenciados por Sisters of Mercy, banda gótica dos anos 80 idealizada pelo inteligentíssimo, e crítico, Andrew Eldritch.

A banda 3 Na Massa tem uma proposta feminina, mas foi idealizada por três homens – Dengue, Pupilo e Rica Amabis. Eles convidaram mulheres que falam, nas músicas, de experiências e desejos com um tom muitas vezes descontraído, e som leve – isso ficou mais aparente ao vivo. Como se sentissem sem sentir, já que as emoções carregam um peso dramático que a banda não possui. Se você gosta de sexo tântrico, lento, talvez seja a trilha sonora perfeita, um pouco blasé, um tímido sexy. A música que me passa mais sentimento é “Tatuí”, interpretada por Karine Carvalho – que tem uma voz leve e firme. Adorei o eletrônico dançante do Instituto Mexicano Del Sonido, eles fazem uma misturada boa, sem sair do tom, como uma música deles é intitulada: Uma “Sinfonia agridoce”, com cumbia, tcha tcha tchas e Placebo – referência para a banda.

Capa do disco, Dark Matter Moving at the Speed of Light (Afrika Bambaataa, 2004)
Capa do disco, Dark Matter Moving at the Speed of Light (Afrika Bambaataa, 2004)

Espero por um show de Afrika Bambaataa há muito tempo. Toda grande expectativa carrega um pouco de frustração, mas os caras são realmente bons. Pois é, Kevin Donovan, o Afrika Bambaataa, fundador da ONG Zulu Nation e o propulsor “oficial” do hip hop e funk, não toca só. Sonhava escutar muita coisa que não tocou. Olhei para o lado e vi Tiger, ex- Faces do Subúrbio, que lançou há pouco o projeto solo “Poder Simbólico”, e DJ Dagga de braços cruzados sacando o show. A sisudez dos garotos me deixou assustada, eles não estariam gostando? O rap e hip hop na música de ambos é notório. “É, eu esperava mais”, disse Tiger, desanimado. Nadilson Silva, pesquisador doutor na área, disse: “Não houve o show esperado pelos fãs. Tínhamos em mente um show completo com a performance do próprio Bambaataa. Nos clipes e shows que conheço, eles se vestes de forma bem provocativa e com conteúdos vinculados á identidade negra. Não sei o que aconteceu nos bastidores. Ele pode estar doente ou sem motivação para o show. Também o show pode ter sido contratado apenas com um DJ, sem a produção necessária. Enfim, o show esperado não aconteceu. As músicas principais como o clássico Planet Rock não foi cantada. O cantores não sabiam as letras direito e pareciam estar improvisando. É uma pena que uma banda tão influente sobre a cultura Manguebeat, Hip-Hop e Funk tenha provocado frustração ao final da apresentação”, disse.

Realmente a banda tocou algo meio poperô, com muito reggaeton. O que não deixou de ser bom, na minha opinião. Dançar ao som de um DJ como Afrika Bambaataa é incrível, ele sabe como ninguém manipular sons sobre sons sem se perder, sem nos fazer parar. Você começa com um passo, depois entra em outro, e outro e outro… sem quebras, sabe como é? Os sons são super sintonizados, um break soul. Uma doideira massa. Adorei, os 25 conto foram bem pagos.

Atrações do APR Club

Terça – 20 de Abril
Orquestra Contemporânea de Olinda
Bongar
Congo Percussivo de Olinda

Quinta – 22 de Abril
Dead Combo (Portugal)
Chambaril
DJ Henrique Amaro (Portugal)

Sexta – 23 de Abril
Siba
Alessandra Leal
Ylana

Sábado – 24 de Abril
Mundo Livre S/A
Camarones Orquestra Guitarristica (RN)
Burro Morto (PB)

Sexta – 30 de Abril
Dead Fish (ES)
Love Toys

Sábado – 31 de Abril Dead Fish (ES) Rotten Flies (PB)

Os shows começam a partir das 22h. Ingressos: R$ 10 (meia entrada); R$ 20 (inteira) e R$ 15 (social – + 1kg de alimento não perecível). Onde? No casarão número 145 da Rua do Apolo, Recife Antigo.

Myspace das bandas que se apresentaram no segundo dia do APR 2010:

Banda Anjo Gabriel, Mini Box Lunar, Plasticol Lunar, Bugs, Vendo 147, Plastique Noir, 3 na Massa, Instituto Mexicano del Sonido, Pato Fu, Wado, Afrika Bambaataa, Nevilton e Zeca Viana