Uma virada
O ano já já vira. Como vira o último dia de férias, o dia mais alegre ou triste da vida, o dia do nosso aniversário. Tudo vira. Vira viado, sacana, bonzinho, cafetão. Vira a página, o vestido avessado, vira as tripas. Tem gente que vira e consegue virar gente. Tem gente que não.
O ano já já vira. Alguns viram como uma noite qualquer, outros viram virando, com gosto de gás. Planejam a viagem durante o ano inteiro, ou ficam à mercê de cada dia, sem nada programar. Sábios os que fazem regime na época da virada, eu nem tento, são muitas rodadas. Vira o número da calça, sempre. E vira mais um monte de coisas e ficam para traz. O sapato apertado, o beijo de plástico, aquele vestido colado.
O ano já já vira, mas tem gente que vira como se não fosse virar, pensa que não perde nem ganha, não para para pensar, um novo ciclo irá começar. Vire as páginas amargas, se elas já foram lidas e sentidas. Vire a ignorância, o preconceito, o rancor. Qual o sentido acumular o que de ruim passou? Deixe cair o peso das costas, afrouxe a gravata, não se deixe oprimir. Esqueça temores neuróticos, o ciúme, a inveja, as cicatrizes do passado. A vida é uma gangorra, reaprenda a brincar.
O ano já já vira. Com todas as vontades, impulsos, destinos, caminhos e milhares de oportunidades. Amanhã é sempre um novo dia. E conspiram os orixás, as marés, luas, santos, anjos, serafins e querubins. O azeite de dendê e a libido, as pessoas que cruzarem em nossas vidas.
O ano já já vira. Permita-se, liberte-se, libere-se. Atravesse a ponte em noites de lua cheia, chegue depois de amanhã, acelere a vida. Diga sim quando quiser sim, diga não quando quiser não, cultive os verdadeiros amigos, queira bem seus familiares por que eles são a chave de tudo. Sonhe. Sonhe. Nunca deixe de sonhar, imaginar o que ainda não aconteceu. Sonhos são pontes. O ano já já vira. E com ele virá todas as bênçãos de Iemanjá.