Pobre Leninha
Pow Pow Pow Pow Pow
Leninha olhou rapidamente de um lado ao outro. Ela sabia que não eram fogos de artifício, nem crianças estourando bolas velhas catadas na frente de um prédio classe A – antes fosse.
– Corre João, corre! Foram as últimas palavras de Leninha.
A menina de 16 anos morreu imaginando bolas coloridas sendo pisoteadas por crianças. Nos cadernos de Leninha, jogados no chão, muitos corações vermelhos desenhados. E um lembrete em letras garrafais: “DIA 20, DENTISTA. DENTES ENTRAMELADOS NUNCA MAIS. EBAAA!” Toninho, seu irmão mais velho, havia dividido em 12 vezes o aparelho que parecia mudar a vida da menina.
João não quer mais ir à escola. Não quer comer, sair para brincar na rua, nem aquele big sorvete o atrai. Dona Zuleide não tem dinheiro para pagar um tratamento psicológico para o pequeno que viu a irmã caindo ensanguentada. João está em choque.
Além de Leninha, mais três homens foram mortos por “balas perdidas” da polícia; que fazia uma ação contra traficantes no Morro dos Macacos. Três trabalhadores assassinados e considerados criminosos, sempre as mesmas desculpas. O filho de um deles não cansa de chamar pelo pai. Sua avó conta uma história bonita, diz que papai está no céu, com santos e anjos, em paz. Mais tarde ele irá descobrir quem matou o pai: o Estado, a Polícia. Talvez se torne um traficante, daqueles que amam matar policiais, afinal, ele já não tem quem coloque o pão na mesa, já não tem bom estudo, nem perspectivas de um futuro promissor.
Leninha é enterrada; João ficou em casa deitado no chão, segurando uma flor arrancada da única coroa. As amigas choram, a comunidade faz uma homenagem linda. E lá no meio, um cartaz de cartolina, com a frase: “Queremos vingança”.